quarta-feira, dezembro 05, 2007

O paraíso fiscal nos concelhos do interior

Há muito tempo que os municípios se desdobram em políticas mais ou menos imaginativas para atrair população jovem e activa para os seus territórios, cada vez mais desertos de gente. Subsídios de nascimento e casamento são os exemplos mais conhecidos, mas por esse País fora o Poder Local desdobra-se em políticas de proximidade social: em alguns concelhos pagam-se os infantários, em outros as autarquias atribuem bolsas de estudo aos jovens universitários. Muitas oferecem habitações a casais jovens, vendem terrenos a preços simbólicos ou baixam os impostos municipais (IMI e o IMT).
Há muito tempo que o Poder Local percebeu, no entanto, que além de atrair gente jovem e activa através de políticas de discriminação positiva, é preciso também criar condições de atracção económica para as empresas, geradoras de emprego.
Lembro-me de, há uns meses, um autarca de uma câmara da região da Serra da Estrela, onde acabara de encerrar a multinacional que era o maior empregador da região, me ter dito que tinha consciência de que as políticas de fixação de população não iam chegar: As pessoas telefonam interessadas em receber o subsidio de fixação oferecido pela câmara, mas perguntam-me se ele está associado a algum emprego.
Mais aquela câmara já não podia fazer: além do apoio directo às pessoas, desenvolvia políticas de atracção económica para as empresas: criara uma zona industrial de raiz, ultra moderna, tinha a derrama pelo mínimo e ainda assim vendia terrenos a preços inferiores a um euro. E mesmo assim, a população continuava a diminuir e as empresas não se instalavam.
Com a nova Lei de Finanças Locais, os municípios passaram a ter a faculdade de interferir nos impostos directos recebidos pela Administração Central do Estado, usando ou abdicando de 5% da receita dos IRS dos seus munícipes. Este é o primeiro ano em que o podem fazer, reflectindo-se a decisão municipal no ano de 2008. Os contribuintes desse município sentirão os efeitos da decisão apenas em 2009, quando for feito o acerto de contas do rendimento de 2008.
Cerca de duas dezenas de autarquias já anunciaram a disposição de abdicar de parte ou do todo desses 5% do IRS dos munícipes. Mas noto que, salvo honrosas excepções, têm sido as autarquias mais pobres - de finanças e de gentes - a abdicar da maior fatia do imposto, enquadrando essa decisão nas políticas de incentivo.

Hoje ao ler na manchete de um jornal gratuito que, devido a este conjunto de medidas, os municípios estão a criar paraísos fiscais, não posso deixar de sorrir, com um cinismo declarado. E volto a lembrar-me do autarca da Serra. Parece que os paraísos fiscais estão longe de criar Oásis e talvez precisassem de políticas nacionais de redução de impostos para poderem, de facto, ser competitivos e atraentes, para pessoas e empresas.
E deixo uma sugestão ao Governo: que tal começar pela redução do IVA, imposto indirecto, que em Portugal é de 21% e em Espanha de 16%?
É que se o IVA fosse gerido pelos municípios, eu não tenho dúvidas de que, pelo menos em toda a linha de fronteira, há muito tempo que o seu valor era inferior ao de Espanha.

E não deixo de reparar no desdém com que a Administração Central do Estado sempre olhou para os subsídios de natalidade até que, face às evidências de uma política demográfica inexistente, ela própria decidiu concedê-los.

1 comentário:

Alan Lemos disse...

Interessante.

Interessante saber que os concelhos do interior estão a dar incentivos para a instalação de pessoas e empresas - mais interessante ainda é a lei portuguesa versar que empresa instalada em Portugal e sediada no exterior está isenta de uma série de impostos. O problema é o pequeno detalhe que os gestores se esquecem: dando esse incentivo, é necessário compensar com outra arrecadação..caso contrário, terão de aceitar uma menor arrecadação per capta.

Um modelo muito interessante é do Estado Empreendedor, onde o governo lucra com a economia, também conhecido como Business State, em geral, Arrecadação Não-tributária.

Caso tais câmaras saibam administrar a implementação dessa outra espécime de arrecadação, prepara-te para o "boom" económico.

Abraços