sexta-feira, maio 30, 2008

O caldo informativo

À saída do Metro, lá estava o novo ardina dos tempos modernos de jornal esticado, à espera que o aceitasse. Assim fiz. Mas, não satisfeito, o homem estancou-me o passo com o indicador estendido: 'Ó menina, leve lá o cubo'.
Sem perceber patavina - excepcionalmente ainda não tinha injectado a dose matinal de cafeína - deixei-me 'empurrar' para a direita onde outro ardina escarafunchava qualquer coisa dentro de um saco. Finalmente titrou a mão e esticou-me um maravilhoso caldo Knorr.
Os meus piores receios concretizaram-se: chegámos a era do verdadeiro caldo informativo. Estou a pensar pô-lo a ferver com um litro de água e juntar-lhe umas massinhas de letras.

terça-feira, maio 27, 2008

Até sempre Cadi

São dolorosos os tempos em que observamos alguns de nós a ficarem pelo caminho, antes do tempo. Mesmo para quem usa as palavras como instrumento de trabalho, não há palavras que consigam iludir o pasmo. Ainda que, e sempre, se estivesse à espera de uma paragem inopinada a meio do percurso. Para quem fica nunca é o tempo certo para ver os outros estancar.
em memória de Cadi Fernandes, jornalista do DN

sábado, maio 24, 2008

Confiar

Por que receamos confiar? Por que confiamos e nos desiludimos? Por que nos desiludimos, se antes acreditámos tanto? Porquê?

Os meus jacarandás no caminho do Oriente





Ficam ali na Rua do Açúcar, em frente ao Palácio da Mitra. É uma das mais bonitas e sentidas colónias de Jacarandás de Lisboa.
Não resisti a brincar com os retoques fotográficos na realidade. Assim, como pinceladas de um pintor excêntrico.

sexta-feira, maio 23, 2008

Saudades II

Deve ser do tempo, esta nostalgia por Álvaro de Campos e das "saudades do tempo em que me escorria manteiga nos dedos".

quinta-feira, maio 22, 2008

A exposição que mudou a minha Cidade

Era um entardecer como outro qualquer, mas a paisagem do lado do Tejo tinha mudado, ali para os lados de Beirolas. Recordo-me do dia 21 de Maio de 1998 quando, de regresso a casa - então na Bobadela (Loures) - pelo recém-inaugurado IC2, me senti envolvida pelos acordes do piano de Michael Nyman que o vento trazia da Doca dos Olivais. Foi nesse momento que senti que toda a minha vida passava por aquele espaço. A minha cidade, a oriente, tinha renascido.

Afundar a economia, por sistema gota a gota

A gasolina voltou a aumentar hoje, pela segunda vez nesta semana. Num dia em que correntes de mensagens de sms e email apelam ao não abastecimento nos postos da Galp e da BP, para contrariar a alegada cartelização (acordo na fixação de preços) das duas companhias.
Ficamos a conhecer, através da Agência Lusa, que nas terras de fronteira quase ninguém usa os postos de combustíveis portugueses. Empresas transportadoras poupam até 500 mil euros ano, só por abastecerem os seus camiões em Espanha. São 500 mil euros que se não ajudam a criar, ajudarão por certo a manter empregos numa zona a todos os títulos abandonada pelo Poder Central.
Acontecesse nas cidades do litoral, o que já está a acontecer nas fronteiras, e há muito que a Galp e a BP teriam descido os preços, sem se desculparem com o valor da carga fiscal que pesa sobre o litro dos combustíveis.
É nas cidades do litoral - onde as correntes de solidariedade são difíceis de implementar - que vive a maior parte das pessoas. E, desgraçadamente, não compensa para os cidadãos de Lisboa ou do Porto, ir a Espanha abastecer o depósito.
Bem pode Ferreira de Oliveira, administrador da Galp, pedir ao Estado que reduza os impostos sobre os combustíveis, desresponsabilizando a sua empresa e sacudindo a água do capote da responsabilidade social, porque daqui a uns meses as receitas do abastecimento irão cair a pique e com elas todos os sectores de produção da economia nacional.
As pessoas já não podem pagar (veja-se a diminuição da circulação rodoviária) e as empresas estão no limite. É a asfixia da economia nacional: gota-a-gota.

segunda-feira, maio 19, 2008

O desdém macro e as políticas micro

Bastou meia dúzia de autarquias (Vila Real de Santo António, Alzejur, Santarém, entre outras) terem promovido deslocações dos seus municípes a Cuba, ajudando-os a resolver problemas oftalmológicos de anos a fio, para o Serviço Nacional de Saúde desbloquear não sei quantos milhões para resolver as listas de espera intermináveis das cirurgias oftalmológicas, pressionado pela Ordem dos Médicos.
É impressionante como as politicas locais e centrais andam de costas voltadas, com natural prejuizo das populações.
Sendo que a Saúde não é uma competência do Poder local - legalmente, mesmo que queiram as autarquias não podem gastar um cêntimo com despesas de saúde - face à incapacidade do Estado em resolver os problemas das suas populações, os autarcas obrigaram-se a encontrar meios expeditos de intervenção: a acção social. Assim, os doentes não vão a Cuba para se tratar, mas para melhorar a sua qualidade de vida.
É criticável? Só se for a ineficiência do Estado que permite que as coisas cheguem a este ponto.
Mas o que mais me impressiona é o desdém com que muitos políticos profissionais e voluntários olham para as iniciativas pioneiras do Poder Local, olhando-o como se fosse uma espécie de poderzinho que se usa quando dá jeito. A maioria das ideias inovadoras da política dos últimos anos nasceu em autarquias e, mais tarde ou mais cedo, foi seguida pela Administração Central. Foi assim, quando as autarquias começaram a conceder incentivos ao casamento e à natalidade, procurando travar a desertificação dos seus territórios. A medida foi desdenhada na praça pública e os seus objectivos ridicularizados. Durante oito anos, com a natalidade a descer para indíces absolutamente preocupantes, o Poder Central ia assobiando para lado e dizendo "não é nada comigo, não é nada comigo". Até que em meados de 2007, o Estado inaugurava os apoios oficiais à natalidade concendendo subsídios às grávidas e reforçando os subsídios de nascimento e o abono de família.
Falta a muitos governantes a escola do Poder Local que com "pequenas" decisões políticas conseguiriam resolver grandes problemas das suas populações.

As explicações da TAP e o cigarro do Governo

Bem sei que o assunto já foi devorado pela espuma dos dias, mas só mesmo a falta de tempo me impediu de botar prosa sobre as explicações que a TAP se apressou a dar, quando se tornaram públicas as baforadas do nosso primeiro-ministro a bordo de um avião fretado pelo governo português. E sobre as quais não vi, não ouvi, nem li qulquer espécie de indignação.
Soubemos pela TAP que quando os aviões são fretados, fica ao critério do cliente a decisão do que se faz a bordo. Ou seja, a TAP não diz, mas deixa subentendido, que se um particular, uma empresa ou um governo alugarem um avião podem fazer lá em cima o que se lhes aprouver, sem que existam responsabilidades de maior. (Imaginamos que se houver um homicídio a bordo, la terá de haver uma investigaçãozita...) De resto, pode-se beber, fumar e, quiçá, tudo o mais que a imaginação permitir. E fica-se descansado porque se alugou o avião e só teremos mesmo é de prestar contas sobre o bom estado de conservação do mesmo.
Mesmo assumindo o divertido do disparate, não deixa de ser rídiculo.
Acontece que a TAP é uma companhia de bandeira. Significa isto que é pública, suportada pelo Orçamento de todos os portugueses. A bordo de uma companhia de bandeira, como de um navio com pavilhão ou de uma embaixada está-se em território nacional dessa bandeira, independentemente do espaço aéreo ou das águas territoriais.
Ora, parece-me com os meus escassos conhecimentos de direito, que a lei portuguesa se aplica em todo território nacional. Mesmo em altitude. A lei portuguesa diz que é proibido fumar em espaços fechados e em trasportes públicos. Fretados ou não. É proibido e pronto.
Fica-nos e ficar-nos-á sempre a dúvida de que basta ter dinheiro para alugar um Airbus que, durante o período de voo, poderemos fazer lá dentro o que bem nos apetecer. Os aviões da TAP ganharam assim uma espécie de estatuto de República Livre das Alturas.

quinta-feira, maio 01, 2008

Lágrimas

Durante anos tive um conflito com as lágrimas. Simplesmente não conseguia chorar perante as coisas e as situações. A dor petrificava-me o sangue. Um nó apertava-se-me na garganta e nada, nenhum liquído, conseguia subir aos olhos. Pensava que se chorasse aceitava, e eu não queria aceitar.
Um acontecimento extraordinário na minha vida tudo alterou. A partir de então, dei por mim a chorar como uma Madalena por tudo e por nada. E sentia-me bem, menos tensa. Percebi, no entanto, que o caso estava a extrapolar o bom senso quando até a publicidade me comovia. Mas inaugurava uma sensação de alivio que a fúria de não conseguir chorar não me permitia atingir.
Hoje continuo a pensar que se chorar aceito e há coisas que eu não quero aceitar. Luto e combato quando penso que tenho razão. Esgoto-me, na mesma dimensão em que acredito.
Mas chega uma altura em que vejo de facto gigantes onde apenas estão moinhos insignificantes. E desisto. Não posso lutar mais. Não quero lutar mais, não me posso consumir nesta luta vã.
Percebo isso quando as lágrimas indisciplinadas me deslizam em silêncio pela cara.
Baixei os braços.