quarta-feira, março 21, 2007

O melhor português

Tenho andado a ponderar qual seria o melhor português de sempre se, porventura, alinhasse com estes critérios redutores da inteligência, com a classificação de pessoas em melhores e piores, se considerasse que as pessoas, as suas estórias e as suas vidas, pudessem ser classificadas por critérios competitivos ou de valores. Aqueles que são os meus, não tem de ser somados aos de outros que pensam como eu. Ou não.
Quando observo a lista dos dez eleitos, de 11 séculos de história da Nação, apetece-me comentar ao contrário. Justificar porque não voto neles.

Afonso Henriques
Tenho cada vez mais dúvidas históricas sobre os fundamentos que deram origem à rixa entre um filho e uma mãe. Que valores se quiseram proteger ao sacudir a dependência de Castela? Dar melhores condições ao povo? Olhando para trás para a História, tenho grandes dúvidas.

Alvaro Cunhal
Foi um grande português. Exemplo de humildade, coragem e determinação com papel relevante na História portuguesa dos últimos 50 anos. Foi também um mártir e um incansável lutador pelos seus ideais, mas deixou de ver o curso da História, a evolução do seu tempo. Parou e perdeu-se nas suas convicções sem ouvir que o mundo pulava e avançava, lá fora. Perdeu uma oportunidade histórica de, em democracia, construir a resistência daqueles que não se queriam acomodar. E desiludiu por isso.

Aristides de Sousa Mendes
Salvou pessoas. Uma, duas, mil, 30 mil. Não importa. Abriu esperança a quem via no horizonte uma morte precoce e anunciada. Deu-lhes passaporte para a vida, abrindo-lhes um local para viver e pagou por isso. Pagou uma factura muito elevada, recompensada para a eternidade por pessoas anónimas, como eu, que se honram de partilhar a mesma nacionalidade do diplomata em Bordéus. Não há um mas, em Aristides.

Fernando Pessoa
O génio do meu poeta preferido, múltiplo de personalidades fascinantes e contraditórias. "Um fingidor" e um sofredor permanente que lhe aguça o génio criativo. Prosa e poesia que mexem com o mais intímo de nós. Ficou demasiado preso à escrita e precisava de mais tempo de vida para ser o maior português de sempre

Infante D. Henrique
O cardel foi um visionário. Coisa que falta a muitos governantes actuais. Percebeu que a nossa vida como Nação teria de passar pelo Oceano. E passou. Mas o resultado ainda hoje me envergonha, quando penso nas atrocidades que se cometeram. Mesmo observadas aos valores da época.

D. João II
A mesma visão do Cardeal, com maior responsabilidade. Foi, de facto, um grande soberano da História de Portugal. Soube governar, gerir sensibilidades e amealhar riqueza. Mas é esta riqueza que ainda hoje me cala a alma lusitana, porque foi construída à custa da exploração do homem pelo homem, dos saques e da delapidação de territórios. E nada na História nos garante que já conhecia o Novo Mundo quando negociou o Tratado de Tordesilhas. É uma coincidência? Pois é, mas por isso mesmo não tem valor histórico.

Luis de Camões
Confesso não ser particular adepta, mas reconheço que é por Camões que o português é a sexta língua mais falada no Mundo. Ainda. Sinto que "A minha pátria é a minha língua", mas não o suficiente para fazer d'Os Lusíadas o trampolim decisivo para a escolha

Marques de Pombal A sua acção "iluminada" foi importante para fazer frente à desgraça do Terramoto. Foi de grande estadista a sua visão para agir, mandando construindo grandes obras públicas de vital importância para o País. As cidades desenhadas a régua e esquadro, com zonas de lazer e praças, ainda hoje perduram como um exemplo de harmonia arquitéctonica do espaço colectivo. A tentação absolutista em que viveu como Rei fez do Primeiro Ministro de D. José um tirano, do qual o processo dos Távoras é o testemunho mais conhecido. Apenas o mais conhecido. É o fiel retrato do ditado popular Se queres ver o vilão, coloca-lhe o pau na mão.

Salazar
Meio século de atraso no desenvolvimento do País. Uma política de atraso cultural e de intolerância da qual ainda hoje pagamos pesada factura. Foi responsável pela opção de políticas bélicas quando no mundo já sopravam ventos de mudança. Foi o mentor e principal impulsionador de uma alma colectiva amordaçada. Não há perdão na História para o fascimo e tudo o que ele representa.

Vasco da Gama
Nem merece estar na lista. Que fez Vasco da Gama? Chegou à India por mar. Mas quem desbravou o mar, quem enfrentou "O mostrengo que a minha alma teme" foram os marinheiros de Bartolomeu Dias. O grande obreiro da travessia do Cabo Bojador. Ele sim, devia estar na lista em vez de Vasco da Gama.

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